sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

RECEITA DE ANO NOVO















Para você ganhar belíssimo Ano Novo

da cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?)


Não precisa
fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumidas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.


Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre


Fonte: http://www.secrel.com.br/jpoesia/drumm.html#receita

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

O TEMPO - Mário Quintana





















A vida é o dever que nós trouxemos para fazer em casa.

Quando se vê, já são seis horas!

Quando de vê, já é sexta-feira!

Quando se vê, já é natal...

Quando se vê, já terminou o ano...

Quando se vê perdemos o amor da nossa vida.

Quando se vê passaram 50 anos!

Agora é tarde demais para ser reprovado...

Se me fosse dado um dia, outra oportunidade, eu nem olhava o relógio.

Seguiria sempre em frente e iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas...
Seguraria o amor que está a minha frente e diria que eu o amo...
E tem mais: não deixe de fazer algo de que gosta devido à falta de tempo.

Não deixe de ter pessoas ao seu lado por puro medo de ser feliz.

A única falta que terá será a desse tempo que, infelizmente, nunca mais voltará.

Mário de Miranda Quintana poeta, tradutor e jornalista brasileiro,nasceu em Alegrete na noite de 30 de julho de 1906 e faleceu em Porto Alegre, em 5 de maio de 1994.
Fonte: http://www.pensador.info/p/a_vida_e_o_dever_que_nos_trouxemos_para_fazer_em_casa/1/

domingo, 5 de outubro de 2008

Mia Couto - biografia



 Mia Couto

(...) Nenhuma palavra
alcança o mundo, eu sei
Ainda assim,
escrevo.
Mia Couto, Poema da Despedida

Mia Couto nasceu na Cidade da Beira (Moçambique) em 1955, filho de uma família de emigrantes portugueses. Publicou os primeiros poemas no "Notícias da Beira", com 14 anos. Em 1972, deixou a Beira e partiu para Lourenço Marques para estudar Medicina. A partir de 1974, começou a fazer jornalismo, tal como o pai. Com a independência de Moçambique, tornou-se director da Agência de Informação de Moçambique (AIM). Dirigiu também a revista semanal "Tempo" e o jornal "Notícias de Maputo".

Em 1985 formou-se em Biologia pela Universidade Eduardo Mondlane. Foi também durante os anos 80 que publicou os primeiros livros de contos. Estreou-se com um livro de poemas, "Raiz de Orvalho" (1983), só publicado em Portugal em 1999. Depois, dois livros de contos: "Vozes anoitecidas" (1986) e "Cada Homem é uma Raça" (1990).Em 1992 publicou o seu primeiro romance, "Terra Sonâmbula". A partir de então, apesar de conciliar as profissões de biólogo e professor, nunca mais deixou a escrita e tornou-se um dos nomes moçambicanos mais traduzidos: espanhol, francês, italiano, alemão, sueco, norueguês e holandês são algumas línguas. Outros livros do autor: "Estórias Abensonhadas" (1994); "A Varanda do Frangipani" (1996); "Vinte e Zinco" (1999); "Contos do Nascer da Terra" (1997); "Mar me quer" (2000); "Na Berma de Nenhuma Estrada e outros contos" (2001); "O Gato e o Escuro" (2001); "O Último Voo do Flamingo" (2000); "Um Rio Chamado Tempo, Uma Casa Chamada Terra" (2002). "O Fio das Missangas" (2004) é o seu último livro de contos.

Em 1999 foi vencedor do prémio Vergílio Ferreira pelo conjunto da obra, um dos mais conceituados prémios literários portugueses, no valor cinco mil euros, que já premiou Maria Velho da Costa, Maria Judite de Carvalho e Eduardo Lourenço, entre outros. Em 2001, recebeu também o Prémio Literário Mário António (que distingue obras e autores dos países africanos lusófonos e de Timor-Leste) atribuído pela Fundação Calouste Gulbenkian por "O Último Voo do Flamingo" (2000).

Fonte:
http://lugardaspalavras.no.sapo.pt/prosa/mia_couto.htm

Os sete sapatos sujos - Mia Couto




Fonte: http://www.youtube.com/watch?v=_hBs3bDYKYs

Poesias - Mia Couto


Mia Couto
https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgYnwMgeOXbnj8_1_DEtpMHwUHd8UHcpkvhZ1PbhN_iVAZ22VqiuITikQi9Od6jFDDvNPwgpwHLNUoNMsy2l9ZXkuZygX7iO9_lD4WSIyE_vovj6VDj0hFuc87U2hJcAxAUo1Ncd5Mzba4/s200/mia_couto%5B1%5D.jpg

Poema da despedida

Não saberei nunca
dizer adeus

Afinal,
só os mortos sabem morrer

Resta ainda tudo,
só nós não podemos ser

Talvez o amor,
neste tempo,
seja ainda cedo

Não é este sossego
que eu queria,
este exílio de tudo,
esta solidão de todos

Agora
não resta de mim
o que seja meu
e quando tento
o magro invento de um sonho
todo o inferno me vem à boca

Nenhuma palavra
alcança o mundo, eu sei
Ainda assim,
escrevo


Pergunta-me

Pergunta-me
se ainda és o meu fogo
se acendes ainda
o minuto de cinza
se despertas
a ave magoada
que se queda
na árvore do meu sangue

Pergunta-me
se o vento não traz nada
se o vento tudo arrasta
se na quietude do lago
repousaram a fúria
e o tropel de mil cavalos

Pergunta-me
se te voltei a encontrar
de todas as vezes que me detive
junto das pontes enevoadas
e se eras tu
quem eu via
na infinita dispersão do meu ser
se eras tu
que reunias pedaços do meu poema
reconstruindo
a folha rasgada
na minha mão descrente

Qualquer coisa
pergunta-me qualquer coisa
uma tolice
um mistério indecifrável
simplesmente
para que eu saiba
que queres ainda saber
para que mesmo sem te responder
saibas o que te quero dizer


Raiz de Orvalho

Sou agora menos eu
e os sonhos
que sonhara ter
em outros leitos despertaram

Quem me dera acontecer
essa morte
de que não se morre
e para um outro fruto
me tentar seiva ascendendo
porque perdi a audácia
do meu próprio destino
soltei ânsia
do meu próprio delírio
e agora sinto
tudo o que os outros sentem
sofro do que eles não sofrem
anoiteço na sua lonjura
e vivendo na vida
que deles desertou
ofereço o mar
que em mim se abre
à viagem mil vezes adiada

De quando em quando
me perco
na procura a raiz do orvalho
e se de mim me desencontro
foi porque de todos os homens
se tornaram todas as coisas
como se todas elas fossem
o eco as mãos
a casa dos gestos
como se todas as coisas
me olhassem
com os olhos de todos os homens

Assim me debruço
na janela do poema
escolho a minha própria neblina
e permito-me ouvir
o leve respirar dos objectos
sepultados em silêncio
e eu invento o que escrevo
escrevendo para me inventar
e tudo me adormece
porque tudo desperta
a secreta voz da infância

Amam-me demasiado
as cosias de que me lembro
e eu entrego-me
como se me furtasse
à sonolenta carícia
desse corpo que faço nascer
dos versos
a que livremente me condeno


Nocturnamente

Nocturnamente te construo
para que sejas palavra do meu corpo

Peito que em mim respira
olhar em que me despojo
na rouquidão da tua carne
me inicio
me anuncio
e me denuncio

Sabes agora para o que venho
e por isso me desconheces



Trajecto

Na vertigem do oceano
vagueio
sou ave que com o seu voo
se embriaga
Atravesso o reverso do céu
e num instante
eleva-se o meu coração sem peso
Como a desamparada pluma
subo ao reino da inconstância
para alojar a palavra inquieta
Na distância que percorro
eu mudo de ser
permuto de existência
surpreendo os homens
na sua secreta obscuridade
transito por quartos
de cortinados desbotados
e nas calcinadas mãos
que esculpiram o mundo
estremeço como quem desabotoa
a primeira nudez de uma mulher

Manhã

Estou
e num breve instante
sinto tudo
sinto-me tudo

Deito-me no meu corpo
e despeço-me de mim
para me encontrar
no próximo olhar

Ausento-me da morte
não quero nada
eu sou tudo
respiro-me até à exaustão

Nada me alimenta
porque sou feito de todas as coisas
e adormeço onde tombam a luz e a poeira

A vida (ensinaram-me assim)
deve ser bebida
quando os lábios estiverem já mortos

Educadamente mortos


Despedida

Aves marinhas soltaram-se dos teus dedos
quando anunciaste a despedida
e eu que habitara lugares secretos
e me embriagara com os teus gestos
recolhi as palavras vagabundas
como a tempestade que engole os barcos
porque ama os pescadores

Impossível separarmo-nos
agora que gravaste o teu sabor
sobre o súbito
e infinito parto do tempo

Por isso te toco
no grão e na erva
e na poeira da luz clara
a minha mão
reconhece a tua face de sal

E quando o mundo suspira
exausto
e desfila entre mercados e ruas
eu escuto sempre a voz que é tua
e que dos lábios
se desprende e se recolhe

Ali onde se embriagam
os corpos dos amantes
o te ventre aceitou a gota inicial
e um novo habitante
enroscou-se no segredo da tua carne

Nesse lugar
encostámos os nossos lábios
à funda circulação do sangue
porque me amavas
eu acreditava ser todos os homens
comandar o sentido das coisas
afogar poentes
despertar séculos à frente
e desenterrar o céu
para com ele cobrir
os teus seios de neve


Saudades

Magoa-me a saudade
do sobressalto dos corpos
ferindo-se de ternura
sói-me a distante lembrança
do teu vestido
caindo aos nossos pés

Magoa-me a saudade
do tempo em que te habitava
como o sal ocupa o mar
como a luz recolhendo-se
nas pupilas desatentas

Seja eu de novo a tua sombra, teu desejo,
tua noite sem remédio
tua virtude, tua carência
eu
que longe de ti sou fraco
eu
que já fui água, seiva vegetal
sou agora gota trémula, raiz exposta

Traz
de novo, meu amor,
a transparência da água
dá ocupação à minha ternura vadia
mergulha os teus dedos
no feitiço do meu peito
e espanta na gruta funda de mim
os animais que atormentam o meu sono


Ser, parecer

Entre o desejo de ser
e o receio de parecer
o tormento da hora cindida

Na desordem do sangue
a aventura de sermos nós
restitui-nos ao ser
que fazemos de conta que somos


Para ti

Foi para ti
que desfolhei a chuva
para ti soltei o perfume da terra
toquei no nada
e para ti foi tudo

Para ti criei todas as palavras
e todas me faltaram
no minuto em que falhei
o sabor do sempre

Para ti dei voz
às minhas mãos
abri os gomos do tempo
assaltei o mundo
e pensei que tudo estava em nós
nesse doce engano
de tudo sermos donos
sem nada termos
simplesmente porque era de noite
e não dormíamos
eu descia em teu peito
para me procurar
e antes que a escuridão
nos cingisse a cintura
ficávamos nos olhos
vivendo de um só olhar
amando de uma só vida



Fonte: http://lugardaspalavras.no.sapo.pt/prosa/mcouto/raiz_orvalho.htm

2008 - Ano Machado de Assis


 
sobre Machado de Assis
Espaço Machado de Assis – Academia Brasileira de Let
http://www.machadodeassis.org.br/
Revista eletrônica e banco de dados
http://www.machadodeassis.net/

Biografiahttp://www.machadodeassis.net/biografia.htm

100 curiosidades sobre Machado de Assis
http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u449921.shtml

Videos sobre Machado de Assishttp://www.academia.org.br/abl_minisites/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?UserActiveTemplate=machadodeassis&infoid=18&sid=14
http://www.youtube.com/watch?v=dAmudKkvem0

Livroclip de Dom Casmurro, de Machado de Assishttp://www.youtube.com/watch?v=D4X_yKkIAqg&feature=related

Livroclip http://www.livroclip.com.br/index.php?acao=hotsite&cod=103

Contos de Machado para downloadhttp://musicapoesiabrasileira.blogspot.com/2008/09/contos-de-machado-de-assis-pra-baixar.html
Machado de Assis – vídeos, contos, livros para download
http://musicapoesiabrasileira.blogspot.com/2008/09/contos-de-machado-de-assis-pra-baixar.html
Biografia em video
http://www.youtube.com/watch?v=TyxaEGkoemw
Desenho animado - biografiahttp://www.youtube.com/watch?v=jbZy49mc5Ks&eurl=http://www.listal.com/video/6671241

Reportagem sobre a Exposição de Machado de Assis no Museu da Lingua Portuguesahttp://diversao.uol.com.br/ultnot/multi/2008/07/16/040270D8A11327.jhtm?metrpolis-exposio-machado-de-assis-040270D8A11327

Vídeo Ministério da Educação – TV Escola – Literatura - Machado de Assishttp://www.qprocura.com.br/dp/18264/Machado-de-Assis:-um-mestre-na-periferia-Mestres-da-Literatura.html

Contos de Machado de Assis on line
http://www2.uol.com.br/machadodeassis/fim.html
Wikipédia – Machado de Assishttp://pt.wikipedia.org/wiki/Machado_de_Assis

2008 - Ano Machado de Assis

Machado de Assis
Jornalista, cronista, contista, romancista, poeta e teatrólogo, Joaquim Maria de Machado de Assis nasceu em 21 de junho de 1839, no Rio de Janeiro, cidade onde também faleceu, em 29 de setembro de 1908. Filho de um operário e uma dona de casa, perdeu a mãe muito cedo e, como não teve condições de realizar estudos regulares, foi um autodidata. É o fundador da cadeira nº 23 da Academia Brasileira de Letras (ABL), tendo sido seu primeiro presidente, cargo que ocupou por mais de dez anos.
Sua obra abrange, praticamente, todos os gêneros literários. Na poesia, inicia com o Romantismo de Crisálidas (1864)
Sit e Falenas (1870), passando pelo Indianismo em Americanas (1875) e o Parnasianismo em Ocidentais (1897-1880). Paralelamente, apareceram as coletâneas de Contos Fluminenses (1870) e Histórias da Meia-Noite (1873), e os romances Ressurreição (1872), A Mão e a Luva (1874), Helena (1876) e Iaiá Garcia (1878).
Depois, Machado de Assis entrou na grande fase das obras-primas - Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1891), Dom Casmurro (1899), Esaú e Jacob (1904) e Memorial de Aires (1908), que fogem a qualquer denominação de escola literária e que o tornaram o escritor maior das letras brasileiras e um dos mais significativos autores da literatura de língua portuguesa.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

João Cabral de Melo Neto















A escultura representa João Cabral, sentado em um banco de praça em gesto contemplativo, no colo segura um livro com seu poema sobre o rio Capibaribe “o cão sem Plumas”

O cão sem plumas

(...) Aquele rio
era como um cão sem plumas.
Nada sabia da chuva azul,
da fonte cor de rosa,
da água do copo de água,
da água do cântaro,
dos peixes de água,
da brisa na água.
Sabia dos caranguejos
de lodo e ferrugem.
Sabia da lama
como de uma mucosa. (...)
Na paisagem do rio
difícil é saber
onde começa o rio;
onde a lama
começa no rio;
onde a terra
começa da lama;
onde o homem, onde a pele começa da lama;
onde começa o homem naquele homem.


O poeta e sua história
"Ele tem um lado popular que se chama João Cabral e
tem um lado aristocrático que se chama Melo Neto. Então, ele é, um pouco, todo
este universo conflituado e passou quarenta anos tentando resolver este
conflito."
Décio Pignatari

Descendente de tradicionais famílias de Pernambuco e da Paraíba, João Cabral de Melo Neto foi o segundo dos seis filhos de Luiz Antonio Cabral de Melo e de Carmem Carneiro Leão Cabral de Melo.
Nasceu no Recife, capital do Estado de Pernambuco, no dia 9 de janeiro de 1920, mas como seu pai era senhor de engenho, passou parte da infância e adolescência em engenhos de açúcar. Primeiro no Poço do Aleixo, em São Lourenço da Mata, e depois nos engenhos Pacoval e Dois Irmãos, no município de Moreno. A vida no campo marcou profundamente o poeta. Apesar da vivência nos grandes centros, Cabral nunca se adaptou à cidade grande e à agitação do mundo urbano, sentindo-se para sempre um homem do interior. Na infância feliz, seu tempo era dividido entre as brincadeiras na casa grande com Virgínio, seu irmão mais velho a quem era muito unido, e os passeios a cavalo pelo canavial. João Cabral era uma criança sensível e, desde pequeno, demostrava preocupação com o ser humano, numa atitude muito singular para sua pouca idade.
Por volta dos oito anos de idade, ele morava com a família em Recife e ía para o engenho no tempo das férias. Seu irmão Virgínio lembrou que, aos domingos, o administrador do engenho ia à feira fazer as compras de mantimentos para a casa. Nestas ocasiões João Cabral dava-lhe dinheiro e encomendava a compra de folhetos de cordel. À tarde ele ia para a moita do engenho e, com os empregados todos ao redor de si, lia três, quatro folhetins para o pessoal do engenho.
O contato com os trabalhadores da usina seria uma experiência fundamental para o poeta pois, mais tarde, na vida adulta, viajando pelo mundo como diplomata, Cabral teria o necessário distanciamento para ver melhor, com preocupação e pungência, a verdadeira realidade do nordeste e retratá-la em sua obra.

Tecendo a manhã



















João Cabral de Melo Neto (1920-1999)

Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.
De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito que um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzem
os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos.

E se encorpando em tela, entre todos,
se erguendo tenda, onde entrem todos,
se entretendendo para todos, no toldo
(a manhã) que plana livre de armação.
A manhã, toldo de um tecido tão aéreo
que, tecido, se eleva por si: luz balão.

sábado, 5 de julho de 2008

FERNANDO PESSOA
































Fernando Pessoa (1888-1935)

Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.

Fonte: http://www.astormentas.com/pessoa.htm

quarta-feira, 2 de julho de 2008

EXCERTOS DE ESCRITORES LUSÓFONOS




















Pintura de Djanira Motta


"A floresta pariu de novo o cimento uma alma nova sinfonia da patchangae um cântico de liberdade!"
Vasco Cabral, Guiné-Bissau

"És tu minha Ilha e minha África forte edesdenhosa dos que te falam à volta".
Francisco José Tenreiro, São Tomé e Príncipe

"A s luzes da cidade brilham no morro. Ainda há pouco vinha do morro um baticum de candomblés e macumbas. Porém agora a cidade está longe e o brilho das estrelas está muito mais perto deles que as lâmpadas eléctricas".
Jorge Amado, Brasil

"Nha Chica conte-me aquela história dos meus irmãos hoje perdidos no mundo grande..."
António Nunes, Cabo Verde

"Era o tempo dos catetes no capim e das fogueiras no cacimbo. Das celestes e viúvas em gaiolas de bordão à porta de casas de pau-a-pique. As buganvílias floriam e havia no céu um azul tão arrogante que não se podia olhar. Era o tempo da paz e do silêncio à sombra de mulembas".
Luandino Vieira, Angola

"A terra treme, a areia salta, o suor escorre, as peles brilham e a voz do chigubo soa. São dois e o sangue à volta é o do chigubo. Os pés batem e o ritmo é bangue, o sangue esquece e só a dança fica, é sura e céu".
José Craveirinha, Moçambique

"Tata-Mailau é o pico-avô da minha ilha".
Fernando Sylvan, Timor

"À medida que as navalhas avançavam, as vinhas iam perdendo a graça, a força e a virgindade. E com esta desolação morria também um pouco da alegria dos vindimadores, que chegavam da Montanha sem sono, a cantar e a dançar, e que agora dormiam como lajes".
Miguel Torga, Portugal

Jorge AMADO, Jubiabá. Lisboa, Livros do Brasil, s.d.
José CRAVEIRINHA, «Chigubo», Hamina e outros Contos. Lisboa, Caminho, 1997 (2ª ed.), pp. 33-37.
Manuel FERREIRA, 50 Poetas Africanos. Lisboa, Plátano Editora, 1997 (2ª ed.).
Fernando SYLVAN, A Voz Fagueira de Oan Tímor. Lisboa, Edições Colibri, 1993.
Miguel TORGA, Vindima. Coimbra, 1997 (6ª ed.).
Luandino VIEIRA, O nascer do sol, A Cidade e a Infância. Lisboa, Edições 70-União dos Escritores Angolanos, 1977 (2ª ed.), pp. 79-87.


Fonte: http://www.instituto-camoes.pt/cvc/tempolingua/02.html

AI, PALAVRAS
















Cecília Meireles (1901-1964)

“A vida só é possível reinventada”


Ai, palavras, ai, palavras,
Que estranha potência a vossa!
Ai, palavras, ai, palavras,
Sois de vento, ides no vento,
No vento que não retorna,
E, em tão rápida existência,
Tudo se forma e transforma!

(...)

A liberdade das almas,
ai! com letras se elabora...
E dos venenos humanos
sois a mais fina retorta:
frágil, frágil como o vidro
e mais que o aço poderosa!
Reis, impérios, povos, tempos,
pelo vosso impulso rodam...

(...)

Detrás de grossas paredes,
De leve, quem vos desfolha?
Pareceis de tênue seda,
Sem peso de ação nem de hora...
- e estais no bico das penas,
- e estais na tinta que se molha,
- e estais nas mãos dos juízes,
- e sois o ferro que arrocha,
- e sois barco para o exílio,
- e sois Moçambique e Angola!

(...)

Ai, palavras, ai, palavras,
Que estranha potência, a vossa!
Éreis um sopro de aragem...
- sois um homem que se enforca!



Biografia de Cecília Meireles

Poetisa, professora, pedagoga e jornalista, cuja poesia lírica e altamente personalista, freqüentemente simples na forma, mas contendo imagens e simbolismos complexos, deu a ela importante posição na literatura brasileira do século XX. Nasceu na cidade do Rio de Janeiro em 07/11/1901 e veio a falecer na mesma cidade em 09/11/64.
Casou-se duas vezes e deixou três filhas.
Embora vivendo sob ifluência do Modernismo, apresenta ainda em sua obra heranças do simbolismo e técnicas do classicismo, gongorismo, romantismo, parnasianismo, realismo e surrealismo, razão pela aual sua poesia é considerada intemporal.
Órfã desde tenra idade, foi criada pela avó Jacinta Garcia Benevides. Desde cedo habituou-se ao exercício da solidão, tendo precocemente desenvolvido sua consciência e sensibilidade. Começou a escrever poesia aos 9 anos de idade. Tornou-se professora pública aos 16, destacando-se como aluna exemplar, merecendo a estima dos mestres.
Dois anos depois iniciou sua carreira literária com a publicação de Espectros (1919), uma coleção de sonetos simbolistas.
A década de 20 foi uma época de revolução na literatura brasileira, mas o trabalho de Cecília naquele período mostra pouca afinidade com as tendências nacionalistas então em voga, ou com o verso livre e a linguagem coloquial.
Boa parte dos críticos, inclusive, consideram suas formas mais tradicionais de poema (como sonetos) o ponto mais alto de sua obra. Com Nunca mais . . . e Poema dos Poemas (1923) adere ao Modernismo. Em 1924 sai Criança meu amor e em 1925 Baladas para El-Rei.
Entre 1925 e 1939 dedicou-se à sua carreira docente publicando vários livros infantis e fundando, em 1934 a Biblioteca Infantil do Rio de Janeiro, a primeira biblioteca infantil do país. A partir deste ano ensinou literatura brasileira em Portugal (Lisboa e Coimbra) e em 1936 foi nomeada para a UFRJ, recém-fundada.
Reaparece no cenário poético após 14 anos de silêncio com Viagem (1939), considerado um marco de maturidade e individualidade na sua obra: recebeu o prêmio de poesia daquele ano da Academia Brasileira de Letras. Daí em diante dedicou-se à carreira literária, publicando regularmente até a sua morte. Vários de seus livros são inspirados nas muitas viagens que fez, viagens estas de grande significação, pois a autora extraiu do contato com gente, costumes e idiomas diferentes matéria de melhor compreensão da vida e da humanidade.
Entre os vários livros de poesia publicados após 1939 tem-se: Vaga Música (1942), Mar Absoluto e Outros Poemas (1945), Retrato Natural (1949), Romanceiro da Inconfidência (1953), Metal Rosicler (1960), Poemas Escritos na Índia (1962), Solombra (1963) e Ou Isto ou Aquilo (temática infantil, 1964).
Escreveu também em prosa, dedicando-se a assuntos pedagógicos e folclóricos. Produziu também prosa lírica, com temas versando sobre sua infância, suas viagens e crônicas circunstanciais. Algumas de suas obras em prosa: Giroflê giroflá (1956), Escolha seu Sonho (1964) e Inéditos (crônicas - 1968).

Fonte: http://www.astormentas.com/din/poema.asp?key=5292&titulo=Biografia

HISTÓRIA DA LÍNGUA PORTUGUESA

FRASES

  • (…) cada língua é um mundo (…) cada cultura é uma galáxia
    com seus próprios critérios de bondade, beleza e verdade.

    Raimon Panikkar (1998)


  • Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver no Universo(...)
    Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer(...)

    Fernando Pessoa (1888 – 1935)

  • A pátria não é a raça, não é o meio,não é o conjunto dos aparelhos econômicos e políticos:é o idioma criado ou herdado pelo povo.
    Olavo Bilac (1865 – 1918)

  • Saudades, só portugueses / Conseguem senti-las bem / Porque têm essa palavra / Para dizer que as têm.
    Fernando Pessoa (1888 – 1935)

  • Minha pátria é a língua portuguesa.
    Fernando Pessoa (1888 – 1935)

  • As palavras me antecedem e ultrapassam, elas me tentam e me modificam, e se não tomo cuidado será tarde demais:as coisas serão ditas sem eu as ter dito.
    Clarice Lispector (1920 – 1977)

  • Criar raízes quiçá seja a necessidade mais importante da alma humana. É uma das mais difíceis de se definir(...)
    Simone Weil (1909 – 1943)

  • Uma língua não nasce em dia e hora certa, nem evoluciona, num momento, de um estado a outro.
    Carolina Michëlis de Vasconcelos (1851 – 1925)


  • A língua é minha pátria e eu não tenho pátria: tenho mátria
    E quero frátria...
    Caetano Veloso (1942 - )

  • Última flor do Lácio, inculta e bela(...) Ouro nativo, que na ganga impuraA bruta mina entre os cascalhos vela...
    Olavo Bilac (1865-1918)

  • Língua mãe de uma pátria universal, mestiçagem de antigos árabesluta e trabalho da raça africana,mescla de sangue da América.
    Wanderlino Arruda, 2005

  • (...)Donzela meiga que, deixando o Lácio, abandona os umbrais do seu palácio, para ser de um povo o glorioso idioma!...
    Waldin de Lima, 1989


  • Uma linguagem comum Importante fator / Para o entendimento / Que é semente do fruto / Da razão e do amor (,,,)
    Martinho da Vila / Elton Medeiros

  • A nossa língua comum foi construída por laços antigos, tão antigos que por vezes lhes perdemos o rasto.
    Mia Couto (1955- )

  • A lusofonia é futuro porque tem passado e presente e vinca na história dos povos lusófonos, abrindo os sulcos do futuro, para a semente ser flor, em liberdade...
    João Padrão, 1994

  • Não és mais do que as outras, mas és nossa, e crescemos em ti, nem se imagina que alguma vez uma outra língua possa pôr-te incolor, ou inodora, insossa.
    Vasco Graça Moura (1942 - )

  • (...) Da minha língua vê-se o mar.
    Vergílio Ferreira (1916-1996).

  • Não morre aquele que deixou na terra a melodia de seu cântico na música de seus versos.
    Cora Coralina (1889 1985)

  • O mar foi ontem o que o idioma pode ser hoje,basta vencer alguns Adamastores.
    Mia Couto (1955- )

  • As línguas aprendem-se, não como uma parte da instrução ou da sabedoria, mas como um instrumento para adquirira instrução e para comunicar aos outros.
    João Amós Comênio (1592-1670).

LÍNGUA
















Caetano Veloso


Gosto de sentir a minha língua roçar
A língua de Luís de Camões
Gosto de ser e de estar
E quero me dedicar
A criar confusões de prosódias
E uma profusão de paródias
Que encurtem dores
E furtem cores como camaleões
Gosto do Pessoa na pessoa
Da rosa no Rosa
E sei que a poesia está para a prosa
Assim como o amor está para a amizade
E quem há de negar que esta lhe é superior
E deixa os portugais morrerem à míngua
"Minha pátria é minha língua"
Fala mangueira! Fala!
Flor do Lácio Sambódromo
Lusamérica latim em pó
O que quer
O que pode
Esta língua?
Vamos atentar para a sintaxe dos paulistas
E o falso inglês relax dos surfistas
Sejamos imperialistas
Vamos na velô da dicção choo choo de
Carmen Miranda
E que o Chico Buarque de Holanda nos resgate
E - xeque-mate - explique-nos
Luanda
Ouçamos com atenção os deles e os delas da
TV Globo
Sejamos o lobo do lobo do homem
Adoro nomes
Nomes em Ã
De coisas como Rã e Imã
Nomes de nomes
Como Scarlet Moon
Chevalier
Glauco Matoso e Arrigo Barnabé e Maria da
Fé e Arrigo Barnabé
Flor do Lácio Sambódromo
Lusamérica latim em pó
O que quer
O que pode
Esta língua?
Incrível
É melhor fazer um canção
Está provado que só é possível
Filosofar em alemão
Se você tem uma idéia incrível
É melhor fazer um canção
Está provado que só é possível
Filosofar em alemão
Blitz quer dizer corísco
Hollyood quer dizer Azevedo
E o Recôncavo, e o Recôncavo, e o
Recôncavo
Meu medo!
A língua é minha pátria
E eu não tenho pátria: tenho mátria
E quero frátria
Poesia concreta e prosa caótica
Ótica futura
Samba -rap, chic-left com banana
Será que ela está no Pão de Açúcar?
Tá craude brô você e tu lhe amo
Qué queu te faço, nego?
Bote ligeiro
Nós canto-falamos como que inveja negros
Que sofrem horrores no gueto do Harlem
Lívros, discos, vídeos à mancheia
E deixe que digam, que pensem e que falem

LÍNGUA PORTUGUESA













Olavo Bilac
(1865 - 1918)

Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...
Amote assim, desconhecida e obscura,

Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela
E o arrolo da saudade e da ternura!
Amo o teu viço agreste e o teu aroma

De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,
Em que da voz materna ouvi: "meu filho!"

E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!

Fonte: http://intervox.nce.ufrj.br/~edpaes/flor.htm