quinta-feira, 29 de outubro de 2009

GUARDAR – Antônio Cícero




Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.
Em cofre não se guarda coisa alguma.
Em cofre perde-se a coisa à vista.
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por
admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.
Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por
ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela,
isto é, estar por ela ou ser por ela.
Por isso melhor se guarda o vôo de um pássaro
Do que um pássaro sem vôos.
Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica,
por isso se declara e declama um poema:
Para guardá-lo:
Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:
Guarde o que quer que guarda um poema:
Por isso o lance do poema:
Por guarda-se o que se quer guardar.


Originalmente publicado no caderno "Idéias/Livros", do Jornal do Brasil, a 8 de março de 1997.
Fotografia de Antônio Cícero: www.cronopios.com.br

COLAR DE CAROLINA - Cecília Meirelles




              Mulher adormecida - Pablo Picasso


Com seu colar de coral,
Carolina
corre por entre as colunas
da colina

O colar de Carolina
colore o colo de cal,
torna corada a menina.

E o sol, vendo aquela cor
do colar de Carolina,
põe coroas de coral

nas colunas da colina.

in "Ou isto ou aquilo", Editora Nova Fronteira, 1990- Rio de Janeiro, Brasil